segunda-feira, 23 de março de 2009

Aos utilitaristas...........................o nada

Em última instância, à exceção das chamadas necessidades básicas, nada serve para nada. Quanto mais dinheiro um cidadão de respeito, bem nutrido e com o sono em dia, acumula, mais ele se empanturra do mais indisfarçavel nada - o qual, por um ausente momento, deixa-o morbidamente feliz. São Paulo é uma cidade em que as pessoas vivem em função de plata. Ou seja, no frigir dos ovos moles, de porra nenhuma. E hoje esbarrei com um jornaleiro mal-humoradíssimo que não quis carregar meu bilhete único (vale-transporte recarregável) sob o pretexto de que não ganharia "nada" para fazer aquilo. Nada o quê, cara-pálida? Mal sabe ele que, na grande maioria das vezes, ele não ganha nada para fazer nada! O que diabos afinal é um veículo de comunicação hoje em dia? Nada. Presta algum serviço de fato útil à sociedade? Nada! E se, com o dinheiro que ganha, por exemplo, ele compra um CD, um aparelho de som, um DVD, uma TV LCD, um carro do ano, ele não comprou, sob sua lógica paradoxal, absolutamente nada de fato válido. Então, para que serve, pragmaticamente falando, ouvir música? Para nada. E ler poesia? Para nadica de nada. No entanto, é no não-pragmático, ocioso, nobre, prenhe de amor, imortal, incorpóreo, na dança que não se desloca a lugar algum, e, assim, não no andar de um ponto ao outro (como já disse Valery), que encontramos o combustível da vida - a pulsão rumo a algum paradeiro zerificado ao qual se soma o número 1. A vida, portanto, é, quando já nos foi entregue o tudo realmente necessário, cosida de reminescências de nada. Nada é o amor. Nada é o sorriso. Nada é a alegria de estar vivo e viver - e isso sim, por outro lado, me parece algo de concreto. A dança - o nada que dá ensejo ao tudo: ou seja, esse tal andar que, por sua vez, transforma nossa trajetória passo a passo e que não tem absolutamente nada a ver com estar a maquinar "Qual será o bem de consumo mirabolante que irei adquirir agora?"
kkkk
Deus, seja Ele quem for, dança. E só. Cabe a nós ouvirmos o nada sinfônico que Dele emana e cavalgar rumo ao destino que se descortina a seu encalço. Se o nada, portanto, impulsiona o tudo, poderia muito bem ser o contrário em termos de significados e significantes. E eu diria ao senhor jornaleiro: "Você está ganhando tudo. Pena que não percebe. Pena que o l'argent - que é nada - lhe parece mais do que um "oi" amistoso, humano. Pena que as pessoas deixaram de confiar umas nas outras, de fitá-las com carinho. Pena que o dinheiro enferrujou as relações, sobrepondo-se a elas, tomando conta de nossas vidas de tal forma que em razão dele passamos a correr deslumbrados em direção ao nada, onde fica o abismo, o buraco negro, os utensílios e funções que parecem nos servir como "tudo", o cadáver. Ouça a canção. Dance, alucine e, em seguida, caminhe resoluto e verdadeiro para a imensidão do próximo. O que nos serve verdadeiramente não é "nada" de natureza hostil e só pode residir no outro. Qualquer outro que esteja "próximo". Na real, logo ali".

Tudo = Nada
Nada = Tudo
(Faça a regra de três)

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