Surrada
Acho que fazia isso há alguns anos atrás. Agora não sei mais. Não quero. Desacostumei. Talvez fosse o costume de trair-se uma norma. Não sei mais separar uma coisa de outra que lhe parece tão própria, twins – desenredar, desentrelaçar, desvencilhar essa pele que virou subcutânea, esse cérebro que, desmazelado, bate no lugar do coração. E quando voltei daquela viagem longa à alma do mundo em que você me conduziu pelas mãos, olho no olho, ser-eno, quase um sobre dois, me deparei com essa surra a olhos vistos. Deixei-me surrar a carne. Açougue humano - um varal de corpos. Descosturei a sutura. O horizonte se fez precipício: não, não cheguei a cair. Mas foi só para ver. Essa coisa de “ver(tigem)” me seduz, embora já não queira mais - é sério. Não posso. Desacostumei. Talvez fosse o costume de se ver livre uma exceção. A neblina embaçava a dor do açoite. Éramos todos jovens e egoístas: kamikazes. Agora, a ferida se esgarça pela malha do tempo, exaurindo o presente até a surra. Puta surra! O que resta é lacônico, pontual e cíclico: esse “não sei. Não quero mais. Desacostumei”. Talvez fosse o costume de degolar-se uma norma. Talvez eu só quisesse fazer parte de um aparte no qual não houvesse para mim qualquer parte cabível. E talvez esse aparte onde não habita viv’alma seja a regra – e tolerar o degredo, a norma. Não quero mais nada disso, por mais que tenha sido cúmplice. Perdoem-me aqueles que (...). Já o dia amanhece, surrado, iluminando tudo, inclusive a dor.
2 comentários:
A pele, a carne ... efeitos de superfície! Apenas efeitos! A nossa pele é Deus tendo a experiência de pensar em si mesmo. Prazer ! Voltemos ao nosso estado de natureza, em que não havia pudor, medo, vergonha, arrependimento, culpa, pecado... Ah e por falar em pecado, quero informar aos carnificeiros que pecar é se afastar da pele!
Interessante, senhor Anônimo. Mas, enfim, deixa pra lá...
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