terça-feira, 21 de julho de 2009

Os hormônios e o século XXI

Apesar de ser um péssimo poeta, Cazuza tinha razão quando dizia que, a despeito da rima, burguesia e poesia não podem ocupar o mesmo lugar no espaço. Em pleno século XXI a sociedade continua dividida em castas, sendo a pior delas, como diz Lukács, a pequena-burguesia, em relação a qual qualquer forma de arte mais elevada é totalmente incompatível. “Enquanto houver burguesia não vai haver poesia”. Em pleno século XXI as pessoas se recusam a se levantar de seus troninhos – onde defecam, dormem, constroem cercas e o diabo – and life goes on. Jean Cocteau profetizou: "a vida é uma queda horizontal" - não por que vamos morrer algum dia, mas por que conseguimos seguir nossas vidinhazinhas em meio ao genocídio alheio, que nos avizinha, sem estar nem aí. Em pleno século XXI vivemos uma peste atrás da outra, sendo a moléstia da vez a tal da porcina, contra a qual não há – não adianta, hermanos – não há prevenção. Em pleno século XXI a sociedade, além de patriarcal, hostil e machista até o útero, continua dividida, na prática, entre aqueles que acreditam em Deus e aqueles que não, sendo que estes não fazem a mínima idéia do que seja esse Tal ente, e aqueles que acreditam, em sua maioria, também não. Em pleno século XXI, os povos primitivos já mostraram ter mais domínio sobre qualquer tecnologia do que o homem civilizado, mesmo assim as últimas aldeias indígenas do Brasil se esvaem como água pelo ralo. Em pleno século XXI vivemos, sim, a barbárie. Em pleno século XXI, não há século XXI – e a mulher, mais particularmente “eu”, sofre de TPM e se põe a reclamar sensibilizada, visto que não há, veja você, te enganaram, século XXI algum. Tudo invenção, estamos na Idade Média. Em pleno século XXI eu abro a janela do apartamento em que moro em São Paulo (essa cidade, esteticamente falando, horrenda) e o que eu vejo é aquela afamada cena de “O sétimo selo” do Bergman: uma montanha e silhuetas próximas ao crepúsculo, em fila, seguindo um líder sem saber para onde ou para quê, à deriva e desnorteadas. Como diz meu sobrinho de quatro anos: “ai, ai, ai...” Um anjinho.

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