segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Brincando de Deus

Na passagem do virtual para o real, da fantasia para o concreto, que, sabemos, jamais se realiza, uma vez que o partilhar do ente, inda mais do ser, se desloca no esteio do tempo perpétuo, algo de lírico se perde. Pessoas imaginárias são degoladas pelo lapso que, tentador, fertiliza a idéia, tornando-a monumental, falsamente realizável, megalomaníaca, à imagem de seu criador: qualquer vacilo como Pedro. Pedro não é Deus. Enquanto milhares de servos e escravos erigem um sítio misto de Amsterdã e Roma, um eldorado, outros tantos definham sob suas anáguas. A imaginação de Pedro mata, desmantela, aniquila, suporta à revelia da razão um universo de faz-de-conta. Não se desdobra em nada de fato, e, quando a realidade dá as caras, não há muito a fazer a não ser encará-la, distorcê-la – acomodar-se como placas tectônicas em seus ornamentos fictícios, em seus contornos defeituosos, em suas axilas mal-cheirosas, em suas fibras bolorentas, em seus pilares bambos. O que “é”, assim, vasculha e espezinha o que "seria", sem deixar rastro. "E é difícil fitá-lo. Não era nada do que imaginava". É caótico, e até medonho, rasgar a existência onírica daquele que com tanto carinho aninhamos entre têmporas. Enterre-o. Você não é Deus. Há um quê de masoquista, incompreensível e inevitável nessa coisa demasiado humana de brincar de Deus.

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