quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Um gosto particular pelo nada
Depois que extraíram meu cérebro, puseram-no em uma pequena bancada de vidro ao lado da porta. Vi Mariah aspergindo-lhe pimenta e suco de tangerina (ou manga, difícil saber sem ter ao menos provado), o que deveria conceder-lhe um arzinho de fresco, saído do forno. E era. Não tinha morrido ainda ou – no mais – não havia morrido em vão. Sentei-me no chão e comecei a imitar um frango. Muito fácil: bastava levantar as alças dos braços e sacudi-las ao léu, em zigue-zague, deixando aparecer as entrelinhas das axilas. Mariah ria. Aquilo deveria ser mesmo risível. Enquanto meu cérebro flambava, disseram-me, comecei a dizer sandices, as quais não posso me lembrar, naturalmente, pois no lugar do cérebro pendia-me uma cabeça oca, algodoada, de onde vertia sangue o bastante para pintar um quadro. Do coração, entretanto, tenho recordações: disparava-me, pois lá pelas dez, à noitinha, senti dores no peito. Era o triunfo oxigenado de não ser.
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Um comentário:
E o sujeito aprendeu a 'chicken dance'. Um bailarino acéfalo à beira de um abismo vazio, ensaiando um passo epiléptico com a sagração de São Vito. Gostei!
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