Passo ao largo de mim mesma. Sublime no parque e a pique, confundo um pássaro com uma ratazana. Sossego: a coisa voa e baila e cantarola. Lindo. O pouco que tinha nas mangas se foi: precisei gastar alguns copeques com um tênis para ele. Mas valeu à pena. Hilário. O Tolsta de all-star fica absolutamente ridículo, e, o que é mais ridículo, preciso me conter para não rir nas fuças dele – ou ele me enfia de novo na máquina do tempo que acredita existir, pois, a contragosto, já andou vendo alguns filmes norte-americanos –, sendo esta tal contenção de despesas, água e risos o que há de verdadeiramente cômico na infame história.
Eis o tênis que comprei pro Tolsta. Ele achou cool, mas se disse adepto da resistência pacífica (!). Eu não entendi.
São Paulo é um desgoverno – e isso ele sente tão logo põe os pés na rua. Quer uma bicicleta – adorou. Na Paulista, segue a via tátil, por mais que eu lhe diga que aquilo é um caminho para cegos. Quando volto, atarantada, todos os mendigos da rua estão lá em casa – para ele são mujiques, imagine – mujiques russos que, como ele mesmo acha que é, despencaram por aqui. E palestra, palestra, palestra: sem fim, endless lecture, ad infinitum. Adora falar. Vous parlez français? – ele pergunta a quase todos. Comme Il faut. Um saco o Tolstói. Mala sem alça. Saudades da Anna e de suas correspondências miúdas. Essa sim foi uma visita, eu diria, troglodita: não saíamos da caverna nem para comer e, dá-lhe Vronski , pude tocar nas feridas adquiridas por ela no embate com o vagão do trem, pobrezinha. Foi quase como tocar nas chagas de Jesus Cristo. Inoportuno era manter seu vício em morfina. Acabou na cracolândia. Desde então, não sei que raios de rumo tomou na (sobre)vida.
À noite, já deitado, Tolstoi insiste em dizer que é o Levin. “Não, de novo não!” – penso. E que o personagem era um alter-ego dele. Dãããã. Eu, claro, não acredito.
“Como assim, Tolsta? Antes ou depois de Freud? Não me engane, hein.”
“Eu não acredito em inconsciente, guria” – ele manda.
“Nem eu” – emendo.
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